sábado, 30 de maio de 2009

Flor de Lótus


No Egito Antigo existiam duas espécies nativas de lótus: o lótus branco (Nymphaea lotus) e a espécie azul (Nymphaea cerulea). A terceira espécie, o lótus rosa (Nelumbo nucifera) veio da Pérsia e cultivada no Egito durante o último período. Estas três espécies aparecem retratadas na arte egípcia. O lótus rosado apareceu especificamente na arte helenística enquanto que o lótus azul, considerado sagrado pelos egípcios, é o que aparece nos hieróglifos.

O lótus ou nenúfar era sagrado para os deuses solares, pois ao nascer, esta planta se volta para o leste como se tivesse prestando honras ao sol nascente. Na arte era utilizado como símbolo do Baixo-Egito e era retratado com suas folhas entrelaçadas com papiros (símbolo do Alto-Egito) simbolizando a unificação de ambas as terras.

O lótus se fecha ao anoitecer e submerge na água. Ao amanhecer emerge e floresce novamente. A flor se converteu no símbolo natural do sol e da criação. Em Hermópolis acreditava-se que existia um lótus gigantesco que emergia das "águas primordiais de Nun" do qual logo aparecia no meio de suas folhas, o deus solar.

Como um símbolo que evoca o "renascimento" era associado a lenda da morte e ressurreição de Osíris. Os quatro filhos de Hórus aparecem sobre o lótus e de frente para Osíris. No Livro dos Mortos o lótus é mencionado com uma citação: "Transforma a ti mesmo num lótus e terás a promessa de ressurreição".

~ Arnaldo Poesia ~

Arnaldo Poesia
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*
Parece mágica
o tesouro no fundo do Mar
- A Flor de Lótus.
*
A imaginação tem a chave
do portal da piscina sagrada
- morada da insólita Flor.
*
Minha'alma flor
nasceu da torre-emborcada
- voou,voltou para mim.
*
Flores aquáticas
nas águas enigmáticas
-espelham a Alma
*
Piscina sagrada
- templo talhado nas entranhas
do coração do Mar.
*
No centro da Terra
a bela engrenagem,matriz da vida
-secreta sideral passagem.
*
No coração da Terra
se realiza a fotossítese
da mentalidade humana.
*
O segredo da Terra
pulsa no coração do Lótus
-igual no coração do homem.
*
Lótus branco azulado
vive e deslumbra consciência
- singular mensageiro.

Nas águas sagradas
templo de colossal beleza
espera conquistador.

Lótus gigante azulado
mega taça da Arca Solar
sustenta mentes e mundos.

*

terça-feira, 26 de maio de 2009

A Rosa de Paracelso




A Rosa de Paracelso

Jorge Luis Borges

De Quincey: Writings, XIII, 345

Em sua oficina, que abarcava os dois cômodos do porão, Paracelso pediu a seu Deus, a seu indeterminado Deus, a qualquer Deus, que lhe enviasse um discípulo.

Entardecia. O escasso fogo da lareira arrojava sombras irregulares. Levantar-se para acender a lâmpada de ferro era demasiado trabalho. Paracelso, distraído pela fadiga, esqueceu-se de sua prece. A noite havia apagado os empoeirados alambiques e o atanor quando bateram à porta. O homem, sonolento, levantou-se, subiu a breve escada de caracol e abriu uma das portadas. Entrou um desconhecido. Também estava muito cansado. Paracelso lhe indicou um banco; o outro sentou-se e esperou. Durante um tempo não trocaram uma palavra.

O mestre foi o primeiro que falou:

- Lembro-me de caras do Ocidente e de caras do Oriente - falou, não sem certa pompa - Não me lembro da tua. Quem és e que desejas de mim?

- O meu nome não importa - replicou o outro - Três dias e três noites tenho caminhado para entrar em tua casa. Quero ser teu discípulo. Trago-te todos os meus bens - e tirou um taleigo que colocou sobre a mesa. As moedas eram muitas e de ouro.

Fê-lo com a mão direita. Paracelso lhe havia dado as costas para acender a lâmpada. Quando se voltou, viu que na mão esquerda ele segurava uma rosa, que o inquietou. Recostou-se, juntou as pontas dos dedos e falou:

- Acreditas que sou capaz de elaborar a pedra que transforma todos os elementos em ouro e ofereces-me ouro. Não é ouro o que procuro, e se o ouro te importa, não serás meu discípulo.

- O ouro não me importa - respondeu o outro. - Essas moedas não são mais do que uma parte da minha vontade de trabalho. Quero que me ensines a Arte; quero percorrer a teu lado o caminho que conduz à Pedra.

Paracelso falou devagar:

- O caminho é a Pedra. O ponto de partida é a Pedra. Se não entendes estas palavras, nada entendes ainda. Cada passo que deres é a meta.

O outro o olhou com receio. Falou com voz diferente:

- Mas, há uma meta?

Paracelso riu-se.

- Os meus difamadores, que não são menos numerosos que estúpidos, dizem que não, e me chamam de impostor. Não lhes dou razão, mas não é impossível que seja uma ilusão. Sei que há um Caminho.

- Estou pronto a percorrê-lo contigo, ainda que devamos caminhar muitos anos. Deixa-me cruzar o deserto. Deixa-me divisar, ao menos de longe, a terra prometida, ainda que os astros não me deixem pisá-la. Mas quero uma prova antes de empreender o caminho.

- Quando? - falou com inquietude Paracelso.

- Agora mesmo - respondeu com brusca decisão o discípulo.

Haviam começado a conversa em latim; agora falavam em alemão. O garoto elevou no ar a rosa.

- É verdade - falou - que podes queimar uma rosa e fazê-la ressurgir das cinzas, por obra da tua Arte. Deixa-me ser testemunha desse prodígio. Isso te peço, e te dedicarei, depois, a minha vida inteira.

- És muito crédulo - disse o mestre - Não és o menestrel da credulidade. Exijo a Fé!

O outro insistiu.

- Precisamente por não ser crédulo, quero ver com os meus olhos a aniquilação e a ressurreição da rosa.

Paracelso a havia tomado e ao falar, brincava com ela.

- És um crédulo - disse. - Perguntas-me se sou capaz de destruí-la?

- Ninguém é incapaz de destruí-la - falou o discípulo.

- Estás equivocado. Acreditas, porventura, que algo pode ser devolvido ao nada? Acreditas que o primeiro Adão no Paraíso pode haver destruído uma só flor ou uma só palha de erva?

- Não estamos no Paraíso - respondeu teimosamente o moço - Aqui, abaixo da lua, tudo é mortal.

Paracelso se havia posto em pé.

- Em que outro lugar estamos? Acreditas que a divindade pode criar um lugar que não seja o Paraíso? Acreditas que a Queda seja outra coisa que ignorar que estamos no Paraíso?

- Uma rosa pode queimar-se - falou, com insolência, o discípulo.

- Ainda fica o fogo na lareira - disse Paracelso - Se atiras esta rosa às brasas, acreditarías que tenha sido consumida e que a cinza é verdadeira. Digo-te que a rosa é eterna e que só a sua aparência pode mudar. Bastar-me-ia uma palavra para que a visse de novo.

- Uma palavra? - perguntou com estranheza o discípulo - O atanor está apagado e estão cheios de pó os alambiques. O que farías para que ressurgissem?

Paracelso olhou-o com tristeza.

- O atanor está apagado - reiterou - e estão cheios de pó os alambiques. Nesta etapa de minha longa jornada uso outros instrumentos.

- Não me atrevo a perguntar quais são - falou o moço, deixando Paracelso na dúvida se foi com astúcia ou com humildade. E continuou - Falastes do que usou a divindade para criar os céus e a terra. Falastes do invisível Paraíso em que estamos e que o pecado original nos oculta. Falastes da Palavra que nos ensina a ciência da Cabala. Peço-te, agora, a mercê de mostrar-me o desaparecimento e o aparecimento da rosa. Não me importa que operes com alambiques ou com o Verbo.

Paracelso refletiu. Depois disse:

- Se eu o fizesse, dirias que se trata de uma aparência imposta pela magia dos teus olhos. O prodígio não te daria a Fé que buscas: Deixa, pois, a Rosa.

O jovem o olhou, sempre receoso. O mestre elevou a voz e lhe disse:

- Além disso, quem és tu para entrar na casa de um mestre e exigir um prodígio? Que fizeste para merecer semelhante dom?

O outro replicou, temeroso:

- Já que nada tenho feito, peço-te, em nome dos muitos anos que estudarei à tua sombra, que me deixes ver a cinza, e depois a Rosa. Não te pedirei mais nada. Acreditarei no testemunho dos meus olhos.

Tomou com brusquidão a rosa encarnada que Paracelso havia deixado sobre a cadeira e a atirou às chamas. A cor se perdeu e só ficou um pouco de cinza. Durante um instante infinito, esperou as palavras e o milagre.

Paracelso não havia se alterado. Falou com curiosa clareza:

- Todos os médicos e todos os boticários de Basiléia afirmam que sou um farsante. Talvez eles estejam certos. Aí está a cinza que foi a rosa e que não o será.

O jovem sentiu vergonha. Paracelso era um charlatão ou um mero visionário e ele, um intruso que havia franqueado a sua porta e o obrigava agora a confessar que as suas famosas artes mágicas eram vãs.

Ajoelhou-se, e falou:

- Tenho agido de maneira imperdoável. Tem-me faltado a Fé que exiges dos crentes. Deixa-me continuar a ver as cinzas. Voltarei quando for mais forte e serei teu discípulo e no final do Caminho, verei a Rosa.

Falava com genuína paixão, mas essa paixão era a piedade que lhe inspirava o velho mestre, tão venerado, tão agredido, tão insigne e portanto tão oco. Quem era ele, Johannes Grisebach, para descobrir com mão sacrílega que detrás da máscara não havia ninguém? Deixar-lhe as moedas de ouro seria esmola. Retomou-as ao sair.

Paracelso acompanhou-o até ao pé da escada e disse-lhe que em sua casa seria sempre bem-vindo. Ambos sabiam que não voltariam a ver-se. Paracelso ficou só. Antes de apagar a lâmpada e de se recostar na velha cadeira de braços, derramou o tênue punhado de cinza na mão côncava e pronunciou uma palavra em voz baixa. A Rosa ressurgiu.

- Fim -

domingo, 24 de maio de 2009

LEDA E O CISNE NA POESIA






Leda e o Cisne,
de Paul Prosper Tillier, 1860

Decidi experimentar volúpia nova
E encarnar princesas mitológicas
Acolhendo as entidades pouco lógicas
Em que Zeus transfigurado punha à prova

A doce e embevecida prontidão
Em tê-lo entre as coxas bem no meio
Ou como chuva de ouro no meu seio
Mesmo que ensopasse meu colchão.

Assim comecei pelo meu cisne
Que ganhara de meu pai, enternecida
Por sua beleza branca enaltecida

Em que senti das plumas como seda
Emergir rubro arpão sem que me tisne
As pétalas e encantos, como Leda...

Selma Alves Rocha

Leda e o cisne
1º Canto

Suave se aproxima em branca plumagem
Cercando Leda no aquecer das penas,
Garboso, empina as asas, distende o carmim olhar
E toca-lhe a pele, com o bico, apenas...

Leda não se move, lânguida
na misteriosa sedução perene,
nem crendo, afasta os joelhos lentamente,
abrindo-se ao Cisne, infrene.

O abraço de asas em vigor é assalto
co'a força do bico na nuca, e presa
sob o peito robusto, o desejo lhe arrebata
no leque de penas que em Leda adentra ...

Imóvel em suas coxas orgasma o Cisne
Rasgando-lhe a gruta vezes eternas,
Estremece em plumagem, treme penugens
Quando Leda o envolve no abraço das pernas!


Leda e o cisne
2º Canto

Um Deus em mim!
Um Cisne em mim!
Esse ato louco
Farfalhando asas
No grunhido rouco...

Um Cisne em mim!
Um Deus em mim!
Nosso êxtase louco
a penugem sagrada
Estremece meu corpo...

Esse ato em mim!
O farfalhar em mim!
Um Cisne louco
Um Deus de asas...


Leda e o cisne
3º Canto

Ela repousa...a beleza adormece
Em meio aos cisnes do calmo lago
Ela repousa...eis a hora!
Nua na relva, no verde afago...

Tão bela...Eis Leda...a proibida
Que a outro pertence e lhe é só sua
Do Olimpo que Deus não a quereria?
Escravo do belo, me rendo....Zeus...

Em desejo me transporto...ei-la!
Desperta aos cisnes de branca plumagem
Seus dedos se estendem nas águas silentes
Seus joelhos se abrem...eterna miragem.

Me visto em penugens e meus braços de asas
Arriscam o vôo até a outra margem
Sacudindo as penas respingo-a inteira
A sentir seu perfume em cada gesto.

Uma carícia...seu afago...Eis a hora!
Leda minha, um Deus a quer
No peito estufado, nas asas turbadas
Nas coxas fêmeas macias...eis a mulher!

É a hora...não se move... Leda espera
A posse alada que já nos domina
Sua nuca mansa, no bico já presa
Faz rendição das pernas que me fascina!

Sobre Leda eis-me! Eis a hora!
Mesclado em desejos... Deus... Cisne!
Mergulho insano na intumescida fenda
Finco em mais sua gruta enquanto cisme!

Tremor, arrepios, gozo tenaz
Eis-me em Leda, é a hora!
Fecundo seu ventre na avidez mordaz
Possuída és, para sempre e agora!


Leda e o cisne
4º Canto
 

Coração já não é o meu
Nem de Zeus
Coração é Leda!!!

Corpo já não é o meu
Nem de Zeus
Corpo é de Leda!!!

*
Desejo já não é o meu
Nem de Zeus
Desejo é de Leda!!!

*
O êxtase
O gozo
O frêmito
A posse
Rendição nossa!!!


Leda e o cisne
5º Canto - Triunfo do Desejo

Nem o sagrado recinto
Dos Deuses, o Panteón

Nem a distância da Terra
Nas margens do lago protegida
Nem as aves, nem o bando
Imunes estão...

*
Basta um olhar!

E do olhar, o desejo
E do desejo o prazer
E que isto se faça e seja
Para matar ou morrer...
*
Transmutar-se, transformar-se
Ser outro ser e não ser
Metamorfosear-se de súbito
Para tudo acontecer...
*
Ao fundo, ao largo, no interno
Nada se confunde, dúvida não há
A vontade se avulta e arremessa
Ao delírio divino que será.

*
Nada imunes, portanto, eis o cuidado!
Ó mortais e deuses de todos os Tempos!
Sempre Leda existirá e um Deus
Se fará Cisne e dela se apossará
Em metamorfoses, sedentos!

Leda e o Cisne 
- Peter Paul Rubens
Holanda, 1577-1640