sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Berlin: nuit de liberté - soir 3 - 10/11/1989


  
BERLIN: nuit de LIBERÉ
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Berlin: nuit de liberté - soir 3 - 10/11/1989



 O muro caiu por causa de uma gafe
- Bendita gafe !!!


A queda abrupta do muro de Berlim deveu-se a um erro do
porta-voz do Politübro do partido comunista da RDA. O
episódio é recordado, esta segunda-feira, 9, no Canal
de História, num ciclo de documentários dedicado ao 20º
aniversário da queda do muro de Berlim
Francisco Galope -  17:20 Domingo, 8 de Nov de 2009




Günter Schabowski, o ex-porta-voz do Politübro, na actualidade


No Outono de 1989 os acontecimentos no território da antiga República Democrática Alemã sucediam-se a uma velocidade estonteante. Os duros do regime tinham sido afastados do poder e substituídos por elementos mais disponíveis para dialogar com os movimentos da oposição.

Günter Schabowski, porta-voz do Politübro, dava diariamente a cara pelo governo e anunciava a novas medidas em conferências de imprensa que eram transmitidas em directo.

Naquela tarde fria de 9 de Outubro, Schabowski, hoje com 80 anos, entrou na sala para ler o comunicado dando conta da resolução do governo que autorizava os alemães orientais a viajar para o ocidente sem quaisquer restrições burocráticas.

Schabowski acabara de receber a nota e mal a lera. No final da conferência, um jornalista da NBC perguntou-lhe quando é que as novas regulações entrariam em vigor. Ele passou os olhos pelo papel e respondeu: "Sofort, unverzüglich [Já, imediatamente]" .

Nesse mesmo instante, a agência Reuters noticiou que os alemães
orientais podiam, desde logo, atravessar a fronteira inter-alemã em
qualquer ponto. Ao mesmo tempo, as notícias transmitidas pela televisão
da Alemanha ocidental (nessa altura uma das principais fontes de
informação independente para a população da Alemanha de Leste)
anunciavam que o muro de Berlim estava a ser aberto.

Poucos minutos depois, dezenas de milhares de alemães orientais
começaram a confluir para o muro que dividia a capital do país dividido.
Sem ordens dos seus superiores e sem saber o que fazer, os guardas fronteiriços simplesmente abriram a fronteira para deixar passar as
multidões, através deste marco da cortina de ferro que separou a
Alemanha e o mundo em campos antagónicos.

O "Erro de Schabowski" é o título de um documentário com que o Canal
de História inicia esta segunda-feira, 9, às 22 horas, um ciclo de
programação dedicado ao 20º aniversário da queda do Muro de Berlim.

O especial "Berlim, 20 anos sem o Muro" vai prolongar-se até 15 de
Novembro e conta com seis documentários "actuais e exclusivos" que
incluem material de arquivo inédito (como filmes de propaganda e vídeos amadores) e entrevistas com antigos guardas do muro, espiões, políticos
e jornalistas, ente outros.


ESPAÑA-MURO BERLÍN-ANIVERSARIO


Era início de mais uma noite fria em Berlim e o calendário marcava 
9 de novembro de 1989. Empossado há poucas semanas, o porta-voz 
do governo da Alemanha Oriental, Günter Schabowski, partia para a sua reunião com a imprensa – realizada diariamente com a flexibilização do regime.

Antes da reunião, Schabowski teve um breve encontro com o líder do 
Partido Comunista, Egon Krenz. Saiu com um memorando com duas
páginas. Leu rapidamente no caminho entre o escritório e o encontro
com os jornalistas.

No documento, a decisão de que, pela primeira vez, os alemães do Leste teriam direito a passaporte. A medida havia sido tomada pelo governo socialista como uma espécie de “pacote de fim de ano” para a população.

Com os passaportes, os cidadãos da Alemanha Oriental poderiam vistar
a parte Ocidental do país, mas sob uma série de restrições burocráticas. Detalhes que não ficaram suficientemente claros durante o encontro com 
a imprensa.

Afobado, Schabowski leu a medida dentre uma lista de vários 
comunicados do partido. Ao final da leitura, um jornalista questionou:
“Quando isso entra em vigor?”.

Confuso, o porta-voz titubeou. Olhou o documento, levantou os olhos 
e respondeu: “Ab sofort” – o que em português significa “agora, imediatamente”.

A resposta criou um burburinho entre os presentes. Eis que outro
jornalista pergunta: “E o que vai acontecer com o muro de Berlim?”. Schabowski não respondeu, encerrou a reunião e foi embora.

Do lado de fora, a notícia se espalhou entre os alemães do Oriente
que acompanharam a divulgação das medidas pela televisão. Milhares
de pessoas foram se reunindo em torno do Muro, concentradas nos 
portões de acesso.

Sem orientações sobre como proceder, os guardas não conseguiam 
contato com os seus superiores e deram de ombros. Os portões se 
abriram. Era tarde demais.






Fonte:  Historiografia  Berlin - ping.fm
Cette nuit le Mur de Berlin est tombé et les Allemands de l'Est se sont précipités à l'ouest. Hélène Risacher a suivi pour nous cette première
nuit de liberté. - BERLIN OUEST 4H45 PORTE DE BRANDEBOURG ...


 CRONOLOGIA  DO  MURO  DE  BERLIM


8 de maio de 1945 – Assinatura da capitulação encerra
a Segunda Guerra Mundial. A Alemanha é dividida em
quatro zonas, administradas pela Inglaterra, França,
Estados Unidos e União Soviética. 4 de dezembro de 1946
– Administração militar soviética ordena a segurança da
linha de demarcação da zona que ocupa.

24 de junho de 1948 – Soviéticos impedem acessos
terrestres a toda Berlim.

26 de junho de 1948 – Estados Unidos criam a ponte
aérea de abastecimento de Berlim Ocidental.

5 de dezembro de 1948 – Eleições à Câmara na parte
ocidental de Berlim consolidam a divisão da cidade.

23 de maio de 1949 – Fundação da República Federal
da Alemanha (RFA), abrangendo as zonas de ocupação
inglesa, francesa e norte-americana.

7 de outubro de 1949 – A zona soviética vira República
Democrática Alemã (RDA).

26 de maio de 1952 – Alemanha Oriental instala postos
de controle de passagem ao longo de toda fronteira
interalemã e bloqueia as linhas telefônicas para o lado
ocidental.

15 de junho de 1961 – Chefe de Estado e de partido
Walter Ulbrichtdeclara em Berlim Oriental que "ninguém
tem o objetivo de construir um muro".

13 de agosto de 1961 – Polícia e Forças Armadas da
Alemanha comunista fecham a fronteira com Berlim
Ocidental.

23 de agosto de 1961 – RDA proíbe berlinenses
ocidentais de entrarem em Berlim Oriental.

24 de agosto de 1961 – Primeira vítima fatal. Günther
Litfin, de 24 anos,é assassinado a tiros por guardas
de fronteira alemães orientais.

19 de dezembro de 1963 – Passes de livre trânsito
permitem a alemães ocidentais visitar os parentes
e amigos em Berlim Oriental pela primeira
vez em dois anos.

13 de junho de 1968 – RDA impõe visto para visitantes
alemães ocidentais em Berlim Oriental.

26 de março de 1970 – Aliados iniciam conversações
sobre o status de Berlim. Começa a política de
reaproximação.

31 de janeiro de 1971 – RDA libera cinco linhas telefônicas
entre Berlim Oriental e Ocidental.

5 de julho de 1973 – Liberado pequeno trânsito de fronteira
para alemães ocidentais.

21 de dezembro de 1972 – Acordo entre os dois Estados
alemães prevê abertura de representações diplomáticas
mútuas.

1974
– Alemanha Oriental instala a "área de segurança"
com arame farpado: uma segunda linha de demarcação
adiante do Muro.

19 de janeiro de 1989 – Chefe de Estado e de partido
Erich Honecker garante que o Muro ainda vai durar 50
ou 100 anos.

5 de fevereiro de 1989 – Última vítima fatal do Muro:
Chris Gueffroy,de 20 anos

5 de maio de 1989 – Hungria começa a remover a cerca
na fronteira com a Áustria, provocando uma fuga em
massa dos alemães orientais para a Alemanha Ocidental
através desses dois países.

7 de outubro de 1989 – Durante a cerimônia de 40 anos
da RDA,o chefe de Estado soviético Mikhail Gorbatchov
apela por reformas na Alemanha Oriental.

18 de outubro de 1989 – Honecker renuncia e é sucedido
por Egon Krenz,que fica poucas semanas no poder.

4 de novembro de 1989 – Um milhão de manifestantes
na Praça Alexanderplatz, em Berlim Oriental, protestam
por reformas.

8 de novembro de 1989 – Desde o último dia 4, haviam
entrado na Alemanha Ocidental mais de 45 mil fugitivos
alemães orientais.

9 de novembro de 1989 – Politburo aprova nova
regulamentação sobre viagens para o Ocidente.
Por causa de um mal-entendido na divulgação
desta notícia pelo secretário de Comunicação do
Comitê Central do Partido Socialista Unitário,
Günter Schabowski, espalha-se no mundo
a notícia de que os alemães orientais podem
sair livremente do país,motivo pelo qual eles se
dirigem em massa aos postos de controle
em Berlim e forçam a abertura de fato da fronteira.


Fonte: Deutsche Welle
          hISTORIOGRAFIA


 Parece foi ontem
a minha marretada histórica
- diante da TV, ao vivo.

 
 
 
 

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quinta-feira, 5 de novembro de 2009

YouTube - SummerFest 2006: Dvorak's Piano Quintet in A Major

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ग्रुपों लोकल La Jolla Symphony: Tchaikovsky's Fifth









YouTube - La Jolla Symphony: Tchaikovsky's Fifth

Grupo Local



A Galáxia de Andrómeda (M31) e as suas companheiras M32 e M110 fazem todas parte do Grupo Local de galáxias. Crédito: Jason Ware.
A matéria não se distribui ao acaso no Universo. Ela surge organizada em estruturas que parecem encaixar umas nas outras, tal como se fossem as peças de um puzzle. Estrelas que encaixam em galáxias, galáxias que encaixam em grupos de galáxias, grupos de galáxias que encaixam em super grupos de galáxias. É a força gravítica a responsável de toda esta arquitectura do Universo, surgindo como o factor de organização de sistemas dinâmicos e em equilíbrio relativo. É possível verificar a existência de grupos de galáxias, constituídos por algumas dezenas de membros, que orbitam em torno de um centro de massa comum. Estes grupos de galáxias podem-se agrupar em super grupos de galáxias, nos quais a troca de matéria entre eles é evidente e com um interesse de estudo substancial.

É consensual definir como Grupo Local de galáxias (GL) um conjunto restrito de galáxias, incluindo a Via Láctea, que orbitam em torno de um centro de massa comum. Ao longo dos próximos textos ir-se-á tentar transmitir a ideia de como surgem organizadas estas estruturas no Universo, na qual a Humanidade se insere.



Ao longo das próximas semanas vamos apresentar os seguintes temas:


Autoria:

Sérgio Batista
Faculdade de Ciências da Universidade do Porto (FCUP)

Referências:
  • Mateo, Mario L (2006). “Local Group”, from Encyclopedia of Astronomy & Astrophysics. Institute of Physics Publishing Bristol and Philadelphia, ISBN:0333750888. DOI: 10.1888/0333750888/1667
  • Barnes, Joshua E (2006). “Groups of Galaxies”, from Encyclopedia of Astronomy & Astrophysics. Institute of Physics Publishing Bristol and Philadelphia, ISBN:0333750888. DOI: 10.1888/0333750888/1671
  • Wikipedia
  • Lago, Teresa (2006). “Descobrir o Universo”, Gradiva. 1ªedição. ISBN:989-616-120-8.













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YouTube - Mozart's Great Mass - Alice Millar Chapel Choir and NUSO

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Sejam felizes todos os seres.
Vivam em paz todos os seres.
Sejam abençoados todos os seres.
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YouTube - Beethoven: Symphony No. 9; Handel: Organ Concerto

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YouTube - Beethoven: Symphony No. 9; Handel: Organ Concerto

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YouTube - Orion nebula

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YouTube - Orion nebula: "la"

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YouTube - Orion constellation

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A PALAVRA E O SILÊNCIO em CLARICE LISPECTOR - Mahler: Symphony No. 2 (Resurrection)


 

 



A PALAVRA E O SILÊNCIO: O ESOTERISMO DE CLARICE LISPECTOR




Assim acontece com a minha palavra que sai de minha boca: ela não volta para mim sem efeito, sem ter cumprido a missão para qual eu a mandei.
Isaías, 55:11

Sou uma iniciada sem seita.
Clarice Lispector, Água Viva

 



A maior ou menor capacidade de nomear o mundo define a maior ou menor perplexidade e terror em relação ao mesmo. No momento em que as coisas são nomeadas, rotuladas, deixam de ser assustadoras e passam a fazer parte do conhecido, do familiar. O processo de apreensão do mundo pela palavra, contudo, tende a revestir a realidade com uma opacidade embrutecedora que anestesia a nossa percepção e nos induz a ver como óbvio, banal, algo que em sua essência é mágico e misterioso. Dentro desse universo, onde a palavra deixou de habitar o mais íntimo da alma humana e perdeu, para usar uma expressão de Guimarães Rosa, a sua condição de “porta para o infinito” , a literatura constitui um elemento de transcendência, um meio de quebrar os condicionamentos limitadores do cotidiano e (re)instaurar o sentido “místico” das coisas. A palavra literária, então, é aquela que está mais próxima da palavra primordial, do primeiro dia da criação, pois está plena da humildade e do cuidado daquilo que se aproxima do mundo para melhor entendê-lo; não para neutralizá-lo. Estabelece-se, assim, uma oposição entre a palavra que está por tocar algo que não “entende”, e a palavra que já rotulou, “entendeu”, e remete o “entendido” para o prosaico e o esquecimento.

Através dessa concepção algo metafísica da palavra é possível ver conexões entre a literatura e a tradição esotérica, uma vez que, como lembra Pierre Riffard, a maior parte das cosmogonias ocultas são descritas em termos lingüísticos, seja atribuindo a Criação a um Verbo criador, a um som primevo ou a uma língua primordial, seja expressando-se através de uma linguagem ou escrita consideradas divinas . Não existe nenhum esoterismo que não atribua um valor simbólico à palavra, que não busque a divinização através do nome e de uma etimologia oculta. O processo iniciático, que se efetua pela quebra do silêncio, através da atribuição de um nome místico ao neófito, encerra-se sempre com a menção do Nome de Deus, com a recitação dos mitos e com a entoação dos sons místicos, isto é, fazendo da palavra a ligação com o Cosmos.

Essa concepção esotérica da palavra encontra sua ramificação mais paradigmática na doutrina religiosa, mística e ocultista denominada “Doutrina do Nome”, segundo a qual o nome é a própria coisa e atribuir um nome equivale a conhecer, compreender, dominar. Pragmática, a “Doutrina do Nome”, através do princípio da simetria, pressupõe uma “Prática do Nome”, a qual se desdobra em planos adivinhatórios (onde a natureza de algo é passível de ser revelada a partir do valor das letras da palavra que o designa); hermenêuticos (a arte combinatória de letras e números, por exemplo); iniciáticos (onde é dado ao buscador os meios de conhecer de cor os textos sagrados e os rituais tradicionais); e mesmo artísticos, onde a “Prática do Nome” é feita através da caligrafia, do desenho na areia, da eufonia e, uma vez mais, da literatura. Mas não qualquer literatura; somente aquela que busca devolver à palavra o seu sentido original, seu caráter iniciático e propiciatório, o qual induz o leitor a um estranhamento com o mundo, com o que está (aparentemente) decodificado, e, assim fazendo, restabelece o mistério das coisas e instaura o espanto do ser que se vê “sendo”.

Clarice Lispector parece ter essa concepção da literatura (e do mundo, uma vez que para ela ambos estão intimamente ligados) e fazendo da palavra um meio de apreensão e revelação do mundo, repete o processo da Criação: Clarice brinca de ser Deus. Dentro dessa linha de pensamento, é possível estabelecer pontos de contato entre a atitude de Clarice diante da linguagem e aquela dos místicos cabalistas, os quais concebem a linguagem como o instrumento de Deus . Assim como Deus, para os cabalistas, não é uma entidade perfeita e precisa constantemente da ação de suas criaturas para a sua afirmação, bem como para a manutenção e aperfeiçoamento de sua obra, os personagens clariceanos parecem intuir uma imperfeição, um desequilíbrio no mundo e em sua fúria rotuladora buscam (re)instaurar a harmonia. No entanto, se a palavra é apaziguante (na medida em que dá um estofo concreto ao mundo), o equilíbrio que ela proporciona é precário e provisório, e a consciência dessa precariedade constitui o elemento deflagrador da escrita de Clarice; escrita essa que tangencia sempre o limiar do indizível, da não palavra, e que revela sempre a inquietude do sujeito que infere que a realidade não é verbal e que o mundo contém algo que as palavras não conseguem enunciar.



A percepção do caráter indizível do mundo e do fracasso da linguagem traz para o texto de Clarice uma certa atmosfera angustiante, que não conta nem ao menos com o artifício tranquilizador da ironia, uma vez que esta pressupõe uma compreensão prévia de uma determinada situação, compreensão que parece ausente em Clarice, na medida em que o predominante em seu texto é justamente o sentimento de perplexidade perante as coisas. É como se ela estivesse permanentemente (re)descobrindo o mundo, daí o estranhamento com as pessoas, com as coisas do mundo, com os objetos do cotidiano.



Essa perplexidade com as coisas, que é quase um não saber prosseguir (uma vez que imobiliza o sujeito), reveste-se de um tom metafísico ao longo de toda a obra clariceana, e mesmo em seus textos mais “tradicionais”, onde a estrutura dos gêneros não parece tão ameaçada, Clarice aborda o mundo por um viés “torto”, esquivo, fazendo com que o que é conhecido, óbvio, adquira um tom inaugural insuspeitado. No entanto, é justamente nesse processo de nomeação quase abstrato, onde a linguagem chega a “se falar”, que a palavra entra em crise e, por assim dizer, fracassa, pois para o fim que Clarice se propõe as palavras, banalizadas pelo uso comum, já se mostram gastas a priori. É necessário, então, inventar um novo léxico, o qual, paradoxalmente, só se torna possível através do seu avesso, da não palavra, do silêncio.


Por esses dois caminhos contraditórios viaja Clarice. Mas, se são contraditórios, não são excludentes, e por vezes quase chegam a se tocar, quanto mais não seja, pela afinidade que ambos apresentam com o pensamento místico, pois se, por um lado, a via da nomeação, o texto clariceano se aproxima da “Doutrina do Nome”, da cabala (mas também da física quântica (4)), por outro, pela via do “esvaziamento” da linguagem, pela busca da apreensão do instante-já, ele se avizinha de algumas doutrinas orientais como o Budismo e o Taoísmo, por exemplo, nos quais, como bem lembra George Steiner, “(...) imagina-se que a alma ascende dos grosseiros obstáculos da matéria, através de domínios de percepção que podem ser transmitidos por linguagem sublime e exata, rumo a um silêncio cada vez mais profundo .”


O silêncio, em Clarice, tem tanto valor quanto a palavra e constitui, de certo modo, o fim último e utópico de sua escrita, no entanto, ela sabe que se o silêncio é a expressão máxima do indizível, é somente através da palavra que se chega a essa conclusão:


..........Eu tenho à medida que designo - e este é o 
esplendorde se ter uma linguagem.Mas eu tenho muito mais à
medida que não consigo designar. A realidade é a matéria-prima,
a linguagem é o modo como vou buscá-la - e como não acho.
Mas é do buscar e não achar que nasce o que eu não conhecia, 
e que instantaneamente reconheço. 
A linguagem é o meu esforço humano. Por destino tenho 
que ir buscar e por destino volto com as mãos vazias. Mas 
volto com o indizível. O indizível só me poderá ser dado 
através do fracasso da minha linguagem.

......Só quando falha a construção, é que obtenho o que 
ela não conseguiu .


Ao contrário do Budismo, contudo (e isso não contradiz o que eu disse antes), a matéria, posta em foco pela palavra, não está reduzida, no mundo clariceano, a um “grosseiro obstáculo”. Ao contrário, ela tem tanta carga de mistério quanto o “espírito”, e talvez seja mesmo mais fantástica, na medida em que se constitui no mistério evidente e palpável, enquanto que o espírito reside no reino do inefável, do abstrato. A consciência disso faz com que o texto de Clarice interaja com as coisas, com os objetos, e deles faça parte. Por essa razão, parece-me equivocada uma análise como a de Luis Costa Lima, que vê na obra de Clarice uma desarticulação com a totalidade concreta . O que ocorre é justamente o contrário: Clarice adere ao concreto, devolvendo às coisas toda a sua carga de materialidade imperativa e onipresente e, nesse sentido, a fala da personagem Ângela, em Um Sopro de Vida, revela-se como uma síntese da percepção que Clarice tem do mundo:

...Não posso ficar olhando demais um objeto
   senão ele me deflagra.

...Mais misteriosa do que a alma é a matéria.
Mais enigmática que o pensamento, é a “coisa”.

A coisa que está às mãos
milagrosamente concreta.



Como se vê, em Clarice Lispector o próprio ato de observação do objeto é uma experiência mística, na medida em que é a partir do objeto que se constrói a consciência dos personagens: o observador se observa através do objeto observado e assim atinge a iluminação. Obviamente, essa experiência, que não é vivida pela maioria das pessoas, necessita de uma mediação para que seja compreendida pelo leitor; mediação essa que se dá pela palavra transformada, isto é, pela palavra despida das limitações impostas pelos seus significados convencionados. De Clarice, então, se pode dizer o que George Steiner diz de Mallarmé: “(...) faz das palavras atos, não fundamentalmente de comunicação, mas de iniciação a um mistério particular, (...) usa palavras correntes em sentidos ocultos e enigmáticos; nós as reconhecemos, mas elas nos dão as costas .


Emblemático desse processo de apagamento dos sentidos atribuídos às palavras (e também do processo de fusão com o objeto), o conto-ensaio O ovo e a galinha  se constrói a partir do jogo de linguagem estabelecido entre o objeto “ovo” e a palavra “ovo” que o nomeia, numa aproximação lúdica e simultânea da linguagem infantil se esboçando, e da mais abstrata especulação filosófico-metafísica, na qual se busca incessantemente, através da reiteração do nome, definir o objeto, sem que, no entanto, se chegue a atingir essa meta, já que quanto mais se acumulam as definições, mais se distancia a essência do objeto.

Paralelamente a essa fúria aproximativa do objeto , contudo, há a preocupação do narrador em não entendê-lo, pois se o entender estará errando. A linguagem do conto, então, não se propõe a elucidar o mistério do ovo; quer apenas mostrar que é mistério, e o que se delineava como um processo de apreensão do objeto, no início do texto, no final revela-se como o desapego supremo, “pois o ovo é um esquivo”, e somente quando deixado livre, “impensado”, é que pode se revelar em sua verdadeira essência.

O círculo que leva da palavra ao silêncio, e deste novamente para a palavra, encontra nesse conto um ponto de equilíbrio, como se ambos, palavra e silêncio, cada um em um “momento” da circunferência, em um dado momento “escorregassem” para um mesmo ponto do círculo, finalmente se encontrando. Nesse sentido, esboça-se, aqui, um processo de aproximação da música, através do artifício do contraponto, o qual atingirá o paroxismo em Água Viva, onde se evidenciam, explicitamente, aqueles traços típicos da escrita de Clarice que já estavam presentes em toda a sua obra anterior mas que aqui aparecem despidos de toda amarra de gênero ou paradigma que limite o sentido: a recusa da narrativa e a busca do silêncio, o qual, se mais do que inapreensível, é incomunicável, ao menos é passível de ser “tocado” através da aproximação daquilo com que mais se parece: a matéria viva, representada em suas formas mais reduzidas e absolutas, como a medusa, a água-viva. O orgânico-primordial, então, confunde-se com o Absoluto, com o espiritual, e sob esse prisma, o elemento “água”, presente ao longo do texto, longe de se constituir unicamente num sentido químico, agrega a si o sentido a ele atribuído pelos antigos alquimistas: água como “um princípio de fluidez, fertilidade; umidade ao mesmo tempo mórbida e geradora” , elemento, enfim, mais sutil que a matéria e a linguagem, pois pode elevar-se como vapor e depositar-se como orvalho; água como elo entre o transcendente, o silêncio; e o concreto, a palavra.

Essa fluidez de água, da qual o texto busca se aproximar, é também a fluidez polifônica de uma peça musical, pois em Água Viva os temas nascem e se repetem num jogo de variações e fuga análogo ao da música. Assim como a música nada mais é do que uma moldura para o silêncio, uma maneira de tornar perceptível a ausência do som, o texto de Água Viva é um longo adágio, um andamento lento e contínuo para além das fronteiras da palavra:

...Que música belíssima ouço no profundo de mim.
É feita de traços geométricos se entrecruzando no ar. 
É música de câmara. Música de câmara é sem melodia.
É modo de expressar o silêncio. 




Sob o aspecto da palavra como um meio de expressão do silêncio, Água Viva talvez seja o texto mais perfeito de Clarice Lispector, pois ao mesmo tempo em que constitui o auge do paradoxo que funda sua escrita (só através da palavra é que o silêncio pode ser dito), também é o momento de resolução do paradoxo, através da abdicação do desejo de relatar o mundo. O mundo, então, com tudo o que ele contém, passa a ser, simplesmente, sem explicações:


.............É-se. Sou-me. Tu te és. (14)


Oposto à idéia de narrativa, de história por contar, esse minimalismo conceitual põe a nu toda o estranhamento e a singularidade do texto de Clarice Lispector, o qual extrapola a condição do meramente literário para atingir o status de metafísica, cosmogonia oculta. Nesse sentido, criando uma obra que postula seus próprios conceitos e inventa seus próprios paradigmas, Clarice Lispector se coloca, conscientemente, à margem de toda e qualquer tradição literária (15), e se inscreve na estirpe dos antigos alquimistas, que viam na matéria o pretexto para atingir o infinito.







JÚLIO CÉSAR DE BITTENCOURT GOMES